Desempenho brasileiro em 2013 anima treinador espanhol

Sob seu comando, Brasil conquistou resultados inéditos no Campeonato Mundial, em outubro / Foto: Pedro Arruda / COB

Rio de Janeiro - Contratado pelo Comitê Olímpico Brasileiro (COB) em abril passado, o treinador espanhol Jesús Morlán chega ao fim de sua primeira temporada à frente da Seleção Brasileira Canoagem Velocidade (canoa) com resultados expressivos e boas perspectivas para o futuro. Em visita à sede do COB, Morlán reuniu-se com a área de esportes da entidade, avaliou o trabalho de 2013 e já iniciou o planejamento para o restante do ciclo olímpico até 2016. A contratação de Jesús, um dos mais vitoriosos treinadores do mundo na modalidade, faz parte do planejamento conjunto do COB com a Confederação Brasileira de Canoagem (CBCa) para elevar ainda mais o patamar do esporte em busca de uma inédita medalha nos Jogos Olímpicos Rio 2016.

Até 2013, Jesús Morlán, que treinava, entre outros, o atleta David Cal, maior medalhista olímpico da história da Espanha, tinha em seu currículo cinco medalhas olímpicas e dez mundiais. No Brasil para preparar um seleto grupo de canoístas, o espanhol surpreendeu o mundo no último Campeonato Mundial, em outubro, na Alemanha, ao somar outras duas conquistas mundiais à sua galeria de prêmios. Apesar de seu objetivo principal ser os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, as duas históricas medalhas de Isaquias Queiroz (ouro no C1 500m e bronze na prova olímpica C1 1000m) e a presença em outras duas finais, com Nivalter Santos e a dupla Erlon Souza e Ronilson Oliveira, na principal competição do ano, demonstram que seu trabalho caminha na direção certa e traz boas expectativas para o futuro da modalidade.
 
“O primeiro ano foi melhor do que o planejado porque normalmente uma temporada tem 46, 48 semanas de treinamento e, desde a minha chegada, tínhamos apenas 21 semanas disponíveis até o mundial. Tratava-se então de conhecer a equipe e fazer o possível dentro deste período. O resultado do mundial foi muito melhor do que o esperado. Até eu fiquei surpreso. Os atletas se saíram muito bem”, revela Jesús Morlán, que como treinador da equipe espanhola, levou David Cal a conquistar cinco medalhas nas três últimas edições de Jogos Olímpicos (um ouro e quatro pratas).
 
Sem o tempo ideal para a preparação dos brasileiros ao Mundial, o espanhol prontamente colocou em prática seus métodos de treinamento. Baseado em tomadas de tempos divididos por distâncias curtas, o novo sistema à princípio causou estranheza, mas não demorou muito para ser assimilado pelos atletas. “O método de trabalho era novo e muito diferente para eles. Utilizamos muitos dados matemáticos. É quase como fazer robôs para a canoagem. Nos primeiros dias, eles ficavam perdidos, não entendiam o treinamento. Até que um dia, o treinamento saiu. E, a partir daí, tudo fluiu. Saíam os tempos, as parciais, tudo estava certinho. Os tempos estavam muito bons e tínhamos quase certeza que ganharíamos uma medalha no mundial”, relata o espanhol. “O que mais me surpreendia era o dia a dia. Eram semanas muito fortes de treinamento e eles sorrindo como que não sentindo a dificuldade dos treinos. O que eu pedia eles davam. O que eu acreditava que eles poderiam, eles faziam. Eu pensava: será que somos capazes de fazer isso? Eram. Será que aguentam? Aguentavam. Cada dia era algo mais”, afirma o treinador.
 
Logo na primeira competição sob seu comando, em junho, na etapa da Copa do Mundo de Poznan, o Brasil conquistou dois ouros e duas pratas. Porém, a confirmação efetiva do bom trabalho veio mesmo em outubro, em Duisburg, Alemanha, quando os brasileiros impressionaram a todos com um desempenho excelente no Campeonato Mundial. “Lembro do sábado que os brasileiros competiram em cinco regatas e ganhamos tudo. Todo mundo só falava de nós. O fim dessa história foi ver o Isaquias, um brasileiro campeão do mundo pela primeira vez, na Alemanha, um país super entendido de canoagem. Aplaudiam muito o Isaquias. Foi um pódio muito bonito. Nunca esquecerei isso na minha vida. No mundial, a equipe brasileira foi o grande destaque. Todas as equipes estavam falando do Brasil. Os treinadores de todo o mundo me cumprimentaram mais pelos resultados dos brasileiros no mundial deste ano do que por todas as medalhas olímpicas que conquistei. Não tenho explicação para o que aconteceu, mas sei que eles treinaram muito e quanto mais eu pedia, mais eles davam”, recorda Jesús.
 
Morlán elogia o potencial do grupo de atletas brasileiros treinados por ele. E ressalta que, após o Mundial toda a equipe do Brasil está entre os sete melhores do mundo. Nivalter Santos, por exemplo, fez os melhores tempos das eliminatórias e semifinais do C1 200m, mas terminou em quinto na final. “O tempo de Nivalter na semifinal foi segundo tempo mais rápido da história da canoagem. Isso não é uma conversa menor. Não temos o melhor do mundo, mas temos o segundo melhor tempo da história. Quem fez isso foi um brasileiro. Pouco a pouco se avança”, acredita.
 
Com tanto talento à disposição, o espanhol já tem o planejamento traçado para os próximos anos do ciclo olímpico, sempre mantendo os pés no chão. “Temos que continuar trabalhando forte. Nada aconteceu. O importante é ganhar as vagas em 2015 e as medalhas em 2016. Você pode ganhar os mundiais de 2013 e 2014, mas se a medalha não vier nos Jogos Olímpicos, você não fez nada. É isso que vale”, enfatiza. “O objetivo era salvar o ano de 2013 como pudéssemos, o que foi feito de forma muito melhor do que eu esperava e para 2014 é fazer toda 4.400km e 750 horas reais de trabalho para fazer toda base aeróbica, grande volume. Os resultados do ano que vem ficam em segundo plano. Não são tão importantes os resultados quanto o trabalho. Vamos guardar tudo de 2014 para gastar em 2015. Temos que fazer um grande 14 para fazer um 15 bem intenso. É aí que estão as vagas”, disse.
 
Na canoa, o Brasil só está com vaga garantida nos Jogos Olímpicos Rio 2016 na prova de C1 1000m. Todo o resto da equipe tem que se qualificar. 
 
Morlán elogiou ainda o suporte oferecido pelo COB e pela CBCa para o sucesso de seu trabalho em 2013. “Não posso fazer nada mais do que agradecer. Tenho conversas diárias com a Jacqueline Godoy, gestora da canoagem no COB. Eu não gosto de pedir muito, mas tudo que foi solicitado, foi prontamente atendido. O fundamental foi que estávamos treinando na represa de Guarapiranga, local com muito vento, e tivemos que mudar para a USP. Então, foi feito um esforço muito grande levando toda a equipe para um hotel em São Paulo, onde moramos até o mundial. Isso fez a diferença. Todo esse sacrifício foi recompensado pelo resultado”, aponta Morlán.