16 medalhas de prata e um cutucão nas leoas do Brasil

A improvisada "medalha" de prata oferecida às jogadoras antes da final contra a Sérvia e a medalha de ouro conquistada no Mundial: símbolos de uma história de sucesso da Seleção Brasileira feminina de handebol / Foto: Paulino Menezes

Rio de Janeiro - Quando o Campeonato Mundial de Handebol Feminino da Sérvia começou para a Seleção Brasileira, em 7 de dezembro de 2013, data em que o país enfrentou seu primeiro desafio, contra a Argélia — que terminou com vitória brasileira por 36 x 20 —, jogadoras e todos na comissão técnica tinham um objetivo muito bem traçado: voltar para casa com uma inédita medalha.

Quinze dias depois do triunfo sobre as argelinas e após incríveis vitórias sobre a China, a Sérvia, o Japão, a Dinamarca, a Holanda, a Hungria e novamente a Dinamarca, nas semifinais, as meninas do Brasil acordaram naquele 22 de dezembro tendo a certeza de que, independentemente do resultado na final contra a Sérvia, a missão a que haviam se comprometido já tinha sido cumprida. Afinal, na pior das hipóteses a medalha de prata já estava assegurada.
 
Ter avançado à decisão de um Campeonato Mundial já representava um feito espetacular para um país que nunca tinha chegado ao pódio nessa competição com nenhuma de suas seleções (masculina ou feminina). Por isso mesmo, após a vitória contra a Dinamarca na semifinal, o treinador Morten Soubak e toda a sua comissão técnica se viram diante de novo desafio.
 
A psicóloga do grupo, Alessandra Dutra, atentou para o fato de que Morten não poderia deixar que houvesse o risco de uma acomodação por parte das jogadoras pelo fato de a medalha de prata já estar assegurada. Era preciso que algum tipo de “choque” emocional tirasse as meninas da zona de conforto antes da decisão. "Falei para o Morten que nós tínhamos que instigá-las de alguma forma antes da final", recordou Alessandra. 
 
Foi então que Morten Soubak, um “dinamarquês-baiano” como ele mesmo se define, que em 2009 assumiu a Seleção Brasileira feminina com o sonho de levar o time a um novo patamar de excelência, teve uma ideia. E prontamente pediu para que supervisora do time, Rita Orsi, providenciasse um pedido inusitado: ele queria 16 medalhas de prata.
 
Rita, então, improvisou. Conseguiu um time de futebol de botão, foi até o restaurante do hotel e com jeitinho pediu um rolo de papel laminado. Com esses ingredientes, ela produziu as simbólicas 16 medalhas de prata de que Morten precisava.
 
Veio o histórico 22 de dezembro. E durante a preleção, naqueles 15 minutos que antecederam a entrada das brasileiras na Kombank Arena, em Belgrado, palco da decisão tomado por cerca de 20 mil torcedores sérvios, uma conversa determinante ocorreu no vestiário brasileiro.
 
“Nós pegamos uma bandeja, a cobrimos com um flâmula do torneio vermelha, a cor do time da Sérvia, e colocamos ali as 16 medalhas de prata. Também conseguimos um casaco vermelho com o número 72, o mesmo da principal jogadora da Sérvia, a Mamute, e fizemos toda a preparação”, recordou Rita.
 
“Então, o Morten apanhou a bandeja e ofereceu as medalhas de prata às meninas. Ele disse: ‘Bom, vocês vieram aqui para conquistar uma medalha e agora vocês já têm essa medalha. É essa aqui, de prata!’”, prosseguiu a supervisora. “Depois disso, o Morten tirou uma medalha de ouro do bolso e mostrou para as meninas e disse: ‘Eu quero uma dessas aqui! E vocês? Vão ficar com essas de prata ou vão querer uma igual à minha?”
 
Com os brios atiçados, todas as jogadoras recusaram as medalhas de prata imediatamente. E foi assim, nesse clima de união em torno de um último objetivo, que as atletas da Seleção Brasileira deixaram o vestiário e partiram para o duelo mais importante de suas vidas.
 
O resto é história. O Brasil venceu a Sérvia por 22 x 20, fechou sua participação no Mundial de forma invicta e voltou para casa com as medalhas de ouro na bagagem. De quebra, Babi foi eleita a melhor goleira da competição e a armadora Duda Amorim foi consagrada a melhor jogadora do Mundial.
 
“Ele (Morten) cutucou o leão com vara curta”, recordou a ponteira Alexandra Nascimento, eleita a melhor jogadora do mundo em 2012, sobre o que viveu naqueles 15 minutos de preleção antes da final contra a Sérvia. “Nós saímos dali preparadas não para um jogo e, sim, para uma batalha, uma guerra”, ressaltou.